Nunca fui muito de travar impulsos. Sério! A minha mãe até me dizia muitas vezes: ganhava eu mais contigo, se o contador contasse, do que com o Ti António a ligar para a França! É óbvio, penso eu, que todos já perceberam que a minha mãe tinha no seu comércio um telefone público. Daí para cá, ainda pouco, lá me vou contendo de impulsionar uma resposta a quem, digo-o eu, não falou para mim, mas para que todos pudessem fazer uma silenciosa reflexão e, com um pouco de boa vontade, acolhessem cegamente o que tinham acabado de ouvir.
Pois bem, hoje, por incrível que pareça, fiz um recolhimento (uma espécie de confissão interior) e perguntei-me várias vezes: vale a pena? vale a pena? vale a pena? x (leia-se: vezes) o infinito! Este recolhimento tinha por base uma questão que roça as fímbrias da teologia, mas que fica muito longe por eu não ser um estudioso ou, sequer, especialista (rápido) do diálogo entre universos paralelos. Pois tudo me soou a isso.
Quer dizer, um homem levanta-se (devagar, para não tropeçar em qualquer questão religiosa sensível, como a verdadeira cor de Cristo ou o grau de inclinação do bigode de Maomé, já para não referir os caracóis típicos de um respeitável judeu ou o raio perfeito da barriga de Buda) e apanha com o dom da audição directamente no centro das suas convicções? Raios partam o Ar da Guarda e as propriedades poluentes (ao nível das substâncias psicotrópicas partilhadas) que esse mesmo ar possui!
Hoje, ouvi alguém (que não vou identificar para que o senhor Bispo da minha diocese não me excomungue - coisa que a minha mãe e a minha esposa nunca me perdoariam) dizer umas coisas. Óbvio que não concordei com tudo e discordei com muito. Daí que tive de escrever!
Ora bem, uma agressão bárbara e criminosa e assassina e ... não tem qualquer tipo de justificação! Ponto! Ponto! Ponto! Ponto! Esse é o princípio básico da condição humana! Aliás, é-o desde que ganhámos consciência uns dos outros e uns dos direitos dos outros! Penso que não me estou a enganar (notem a ironia) quando digo que existe um mandamento nosso (pois sou cristão) que diz: Não matarás! Certo? Logo, quem mata precisa de um conjunto de juízes e advogados (à boa maneira portuguesa) que dão tantas voltas à questão que se vai descobrir que o culpado é o assassinado por estar na frente das balas (leia-se: qualquer tipo de arma) que o assassino (leia-se à maneira da justiça portuguesa: pobre coitado que teve motivações, porventura erradas, mas que respondem a provocações) por querer e conscientemente disparou? Precisa, pois tem direito a uma defesa. Concordemos ou não com essa defesa. Já viu como os corruptos se safam, não já?
Agora, a "sociedade tem de repensar a liberdade de expressão"? São isto laivos do Cardeal Cerejeira? Quererá, porventura (pois eu tendo a ser um abusado ao nível da interpretação que faço destas coisas), dizer que terá de deixar de existir "liberdade de expressão" pois algumas questões são tabu? Ou dogmas? Ou questões que implicam uma queda para a cova? Veja bem, eu, que até sou um crente (esquisito, mas crente!), tenho uma certa dificuldade em aceitar um regresso ao século XII, quando os Reis se sujeitavam aos ditames e regras da religião para poderem armar-se como Reis. Verá que eu nem falo dos desgraçados que se chamavam "povo", como ainda agora. Já em relação ao não discutir certos assuntos... Sim, bem sei, bem sei que existe uma ou outra coisas curiosas na nossa religião que não merecem discussão, mas o que me impede de a não discutir? Porventura, teremos algum braço armado fundamentalista que me corte a língua ou os dedos se eu o fizer? Penso que não, mas... Sim, também sei, também sei que os primeiros divórcios foram uma dor de cabeça para a Igreja, que preferia uma mulher com um braço partido e submissa à virilidade do pater familias e assim uma boa dona da casa e seguidora dos desígnios divinos. Mas hoje estamos errados, ou não? Não me vai dizer que se nega a comunhão a mulheres divorciadas, pois não?
Ora bem outra vez, outro dos aspectos interessantes é o diálogo transformado num monólogo. Melhor dizendo, o respeito pelas convicções dos outros não dá direito a que as pessoas que não concordem com essas convicções as exponham? Ou, como fica bem, umas pessoas podem ter as convicções que quiserem e outras não? Eu posso ter as minhas convicções religiosas e o Manel (refiro-me àquele do Jorge Jesus) ser completamente contrário a isso e desconfiar dessas mesmas convicções, certo? Podemos trocar argumentos a favor ou contra qualquer dos nossos campos defensivos, mas não deixamos ambos de ter razão. Nesta campo lembrou-me um senhor chamado António que tinha aprendido em Santa Comba Dão que Não se discute a pátria! Claro que, aqui pela Guarda, não é só o senhor que eu ouvi que soa a Santa Comba Dão.
E, para terminar, multiculturalidade não é a aceitação do que os outros nos impingem! Multiculturalidade é o respeito e a aceitação da diferença, não existindo a submissão de nenhuma das partes diferentes. Aliás, a multiculturalidade encoraja a diferença e a convivência entre as culturas. E nisso não vejo cinzentismo nenhum, vejo sim o direito de escolher a cor que preferem e a adopção daquela cor que lhes parece mais coerente. Mesmo que não seja a nossa, devemos respeitar a escolha dos outros. Parece-me que o diálogo inter-religioso é defensor disso mesmo.
Agora, parece-me que o caso final, o caso das escolas portuguesas, é o cúmulo de tudo. Então a laicização do ensino não deveria integrar religiões? Claro que ao lado de uma cruz podemos colocar mil símbolos religiosos e assim ter uma sala mais vestidinha e mais repleta de multiculturalidade. Ou, numa sociedade inclusiva, devemos nós icluir tudo e todos no nosso pensamento e credo? Mas isso é tolher as liberdades. Ou não?
Pois bem, leiam-me com ironia e com alguma dose de alucinação, mas penso que devem, principalmente, dar-me a liberdade de escrever o que bem e sobre o que bem me apetecer. Como eu vos estou a dar a liberdade para lerem ou para não lerem.
Em todo o caso, também podem responder. Não o façam é com balas, sou alérgico!