Espero por vós nas primeiras apresentações já agendadas de EU! KRAPP...
Serão nos dias 12 e 19 de Fevereiro!
Fui, e muito bem, questionado por um leitor deste blogue (que os há!) das razões que me levaram a não estar tão presente neste que é um dos meus espaços prediletos para partilhar o que vou pensando.
As razões são muitas, mas, depois de feita a reflexão necessária, percebi que nada impede a equilibrada partilha e escrita, uma vez que a mesma vai sendo feita noutras plataformas. Assim sendo, irei recomeçar a intervir e publicar neste espaço.
Prometo que tentarei ser regular e dialogante com quem quiser, depois, questionar ou discordar comigo. Em democracia é assim! E, infelizmente, tenho vivido cada vez menos em espaços de diálogo e de democracia. Começarei, portanto, por em breve dar-vos conta daquilo que são as minhas impressões sobre as eleições, e as movimentações que as rodearam, no concelho onde voto: Gouveia.
Até já!
Não invejo as conquistas dos outros. Nunca invejei. Desde pequeno, desde a mais tenra idade, sempre me lembro de partilhar e de dar a quem me rodeava aquilo que eu tinha ou que me era dado, naquele breve momento, possuir como meu. Desde essa altura, tenho muitas dificuldades em descobrir um só instante em que a inveja ou o desejo de ter algo meu fosse uma realidade que prejudicasse alguém. Sim, sempre pensei mais nos outros do que em mim. Cresci, continuei a dar o que tinha e o que não tinha, senti-me tantas e tantas vezes mal por ser tantas e tantas vezes prejudicado por não ser filho de pais que fazem parte de grupos de influência e que facilitam a vida dos filhos. Mesmo assim, continuei sempre a dar o pouco que tinha.
Neste instante de agora, tantos e tantos anos depois, sinto-me no fim de uma linha. Não consigo ser diferente, tento e tento perseguir o ser que sempre fui na relação com os outros, seja dentro da família ou fora dela, tento, no entanto, ser feliz com aquilo que tenho e que sinto que consegui de forma honesta, trabalhadora e simples. Não vou ser diferente daquilo que fui, pois não sou um ser diferente daquilo que aprendi e que me fez o homem que todos conhecem. Mas sinto que já só consigo respirar lá dentro, no escuro, escondido de quem, afinal, deveria ajudar-me a respirar.
A vida é feita de nadas:
De grandes serras paradas
À espera de movimento;
De searas onduladas… pelo vento;
De casas de moradia
Caídas e com sinais
De ninhos que outrora havia
Nos beirais;
De poeira;
De sombra de uma figueira;
De ver esta maravilha:
Meu Pai a erguer uma videira
Como uma mãe que faz a trança à filha.
Comecei por ler um poema de Miguel Torga que, espero, possa
ser a porta de entrada para o entendimento de todas as outras palavras que se
seguem.
Coube-me,
hoje, a responsabilidade de, nesta tarde de tempos inquietos, lembrar e
partilhar convosco um pouco da vida e gestos de duas pedras basilares do
Instituto de Gouveia que este ano partiram, como todos sabemos, em
circunstâncias difíceis de entender. Difíceis de entender porque a vida nos tem
habituado a que a longevidade seja uma realidade e também porque nada nem
ninguém nos prepara para a partida de amigos que nos fazem bem. E estes que nos
partiram, meus caros, eram pessoas de bem e que nos faziam bem. E digo
“partiram” no sentido múltiplo da palavra, que implica afastamento mas também
desagregação ou destruição. De uma forma mais simples, todos sentimos, desde a
dupla partida, a dor e uma sensação de desajuste que o tempo, dizem, tratará de
aligeirar.
Tinham,
estes que lembramos, defeitos? Certamente teriam. Tinham momentos menos bons? De
certeza que sim. Mas tinham, acima de tudo, uma presença que a todos agradava e
que a todos completava. Falo, obviamente, e digo-o como eu os chamava, do
Engenheiro Maia e do Pires. Desculpem-me esta fuga para um discurso mais
informal, eventualmente menos laudatório, mas os dois homens que eu conheci
tinham os pés na terra e era dela que se erguiam, tal como a “videira” de que
falava Torga.
Espíritos
inquietos, digo eu, que se mostravam através do gosto pelas artes e pela
cultura, como sempre, e bem!, fizeram questão de vincar, seja através da
ligação às direções de várias associações culturais do concelho, seja através
da dedicação pessoal e cuidadosa à prática e cultivo dessa mesma veia criativa.
No caso do Pires através do gesto fino e certeiro com que nasciam desenhos,
pinturas ou uma ou outra personagem em momentos teatrais. No caso do Engenheiro
Maia através do gesto amplo e paternal com que desafiava, acolhia, regava e
encorajava as ideias que, muitas vezes, tantos de nós lhe propúnhamos.
Poderíamos pensar que (e nos dias de hoje seria o mais óbvio!) o gesto fino e o
gesto amplo entrariam em conflito. E talvez, por vezes, as ideias não fossem
completamente comuns. Mas os homens que conheci e que comigo, e com todos nós,
partilharam momentos, tinham o dom da palavra. E digo palavra porque o ponto de
encontro entre todos é, e deve continuar a ser, o da partilha da palavra. O
diálogo que é como a imagem “da mãe a fazer a trança à filha”: admirável e
digno de atenção.
Felizmente
todos tivemos a oportunidade de partilhar a palavra com eles. Seja no gabinete
da Direção, onde ao final do dia, tantas vezes, se constituía uma “mesa
redonda” de troca de opiniões, de preocupações, mas também de desejos e de
ambições. Tudo sempre regado com uma boa dose de humor, e de fina ironia, que
espicaçava os sorrisos e nos dava a exacta dimensão dos dias.
Caros
amigos, do Pires conhecemos o caminhar, desde tenra idade, desde África até
Gouveia e por aqui marcar um espaço ímpar. Do Engenheiro Maia conhecemos a sua
ligação à terra, desde criança, nas difíceis caminhadas pelos montes, mas
também na busca incessante por melhor servir, por saber mais sobre esta mesma
terra e por descobrir novos caminhos para ela.
Os
dois souberam, tal como o pai que ergue a videira, abraçar a missão de erguer
mais e mais o Instituto de Gouveia a cada dia que lhe dedicaram.
Hoje
agradecemos nós aos dois pelos sorrisos que partilhámos juntos!
Gouveia, 19 de Setembro de 2020