Por incrível que pareça, não foram
os incêndios das últimas semanas que estiveram no foco reflexivo principal de
todos aqueles que vivem os bombeiros portugueses com intensidade e sinceridade.
Por incrível que pareça, foram as
letras gordas dos jornais e os sons agressivos da rádio e televisão a anunciar
que alguns dos “nossos” bombeiros eram responsáveis pelo início de um sem
número de incêndios, foram as notícias a anunciar que dois dos “nossos” bombeiros
tinham sido apanhados devidamente uniformizados em pleno acto de tráfico de
droga, foram as notícias de um dos “nossos” bombeiros que usou a ambulância para
a prática de sexo… Estes foram os momentos negros que importa, sim, trazer para
a discussão e lançar uma pergunta que merece, sim, uma visão mais romântica (o
estatuto agónico do bombeiro é sempre uma visão que vende bem), mas será
preciso, principalmente, que essa mesma pergunta tenha uma resposta bem mais
realista: O que é um Bombeiro?
Dos casos que atrás se enunciaram,
e que estiveram presentes nos intervalos do combate a incêndios, o último (sim,
o do bombeiro, sexo e uma ambulância) merecerá uma menção especial e rápida,
pois trata-se de uma questão de cinema. O desejo despertado pelos filmes sobre
bombeiros, de origem principalmente norte-americana, na mente dos bombeiros
portugueses poderá ter originado esse acontecimento, juntando-se por fim aquele
célebre provérbio que diz que a “ocasião faz o ladrão”. Neste caso, parecerá
que o calor terá elevado os corpos a um estado tal de desejo que a
irracionalidade provocada pelos filmes e pelo sexo terá sido mais forte. Um
descuido? Um acto irreflectido? Um desejo secreto? Talvez, mas um mau princípio
e uma atitude primária que deve estar longe de seres que se querem racionais e
objectivos na missão que quiseram abraçar. Logo, querem-se homens e mulheres
que cumpram as suas missões e que não se remetam a momentos que, acredito,
possam ser interessantes mas que não são os daquele espaço. Para além disso, e
vendo o lado positivo e risível, pode ser uma boa oportunidade de negócio para
os empreendedores dos encontros românticos: vá, empresários da hotelaria,
empreendam e abram um quartito para encontros românticos dentro de uma ABTD!
Aposto que terão clientes e que o sucesso será tal que até me poderão atribuir
uma percentagem desses ganhos.
Os casos dos bombeiros
incendiários e do tráfico de droga são questões de polícia e merecem, da parte
de quem se entrega a esta causa de forma honesta, o tratamento mais radical
possível. Nós, bombeiros portugueses, temos pais, irmãos, amigos que morreram
em incêndios e não podemos permitir que os “nossos” bombeiros nos coloquem em
risco só porque estão mal dispostos ou tiveram um mau dia. Esses homens e
mulheres não merecem nem podem estar do nosso lado e devem, de imediato, ser
expulsos de todos os corpos de bombeiros e entregues às autoridades policiais.
Não pode nem deve haver contemplação com estas atitudes que, como todos
sabemos, nos colocam em risco máximo. E isto é extensível aos “nossos” que nos
comprometem ao utilizar drogas ou ao praticar qualquer tipo de negócio obscuro ao
coberto do bom nome dos bombeiros. Vejam que não foi o “João” ou o “António”
que foram detidos por tráfico de droga ou por crime de incêndio. Foram os
“bombeiros” que foram detidos. É toda a estrutura dos bombeiros, todos aqueles
que dão de si na defesa da sociedade e na defesa das pessoas e bens, que estão
a ser expostos pelos crimes de meia dúzia de delinquentes que contaminam as
nossas fileiras.
Sim, tudo isto para chegar ao
ponto e à questão fulcral que é preciso colocar de forma fria e objectiva: estamos nós, bombeiros portugueses, a
recrutar quem não pode nem deve ser recrutado?
Famalicão da Serra, 7 de Setembro de 2014
Daniel António Neto Rocha
(crónica publicada no Portal Bombeiros.pt no dia 8 de Setembro de 2014)
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